Dauro Veras (link ao lado) escreveu um post muito legal sobre livros. E instigou os visitantes a listar alguns livros que de alguma forma os influenciaram. Fiz uma pequena lista dos primeiros livros que me vieram à cabeça:
1. Desafio aos Deuses: Uma Breve História do Risco. (Bernstein)
2. Ensaios Analíticos (M. H. Simonsen)
3. Conjectures and Refutations (Karl Popper)
4. Manual do Perfeito Idiota Latino Americano (Llosa et all)
5. A Sangue Frio (Truman Capote)
É claro que há mais. Poderia citar até o manual de microeconomia do Varian. E o mais perto que consegui chegar do jornalismo foi o título do Truman Capote, mesmo.
O Dauro é um cara bacana. Está, hoje, mais à esquerda do que eu no espectro político. Até porque essa distinção entre esquerda e direita, na minha opinião, já não mais se sustenta. Mas também eu fui um esquerdista, por muito mais tempo do que deveria. Hoje sou um porco liberal a serviço do capitalismo da civilização judaico-cristã ocidental. Tanto que o blog do Dauro é o único mais "à esquerda" na lista de links aí à direita (ops!).
Temos, eu e Dauro, em comum a tolerância. Notem que também ele tem um link para o blog do Aluizio Amorim, cujas idéias são bem difererentes das dele, creio. Eu tenho um amigo e colega de profissão com quem travo longas discussões sobre política, ou melhor, sobre o governo. A gente quebra o pau, mas não deixa de conviver bem. É por isso que visito o blog do Dauro com regularidade. E também porque é bem escrito.
Ah, ia esquecendo: faça a sua lista.
sexta-feira, setembro 28, 2007
quarta-feira, setembro 26, 2007
Genial
Texto de Cláudio Angelo, editor de ciência da Folha de S. Paulo. Uma mostra de que há vida inteligente no jornalismo brasileiro. Não poupa as bobagens pós-modernas e politicamente corretas.
Tive o desprazer de conversar com Richard Dawkins apenas duas vezes na vida. É um sujeito antipático, pedante e de uma intolerância insuportável. Exatamente o oposto da personalidade que se espera encontrar em alguém cuja profissão de (ops!) fé é levar a ciência ao grande público. E que é, goste-se ou não dele, um dos intelectuais mais brilhantes que a seleção natural já produziu.
Talvez essa certeza de superioridade, que transborda nos escritos do biólogo britânico, explique em parte por que Dawkins é tão vilipendiado pelos ditos intelectuais "de esquerda" e "culturalistas", para não falar nos (credo!) pós-modernos. Essa patota não hesita em pichá-lo de darwinista bitolado que não consegue enxergar nada além de genes egoístas tramando a destruição do livre-arbítrio humano.
São poucos, no entanto, os que terão notado a seguinte passagem no clássico dos clássicos de Dawkins, "O Gene Egoísta", de 1976: "Para compreender a evolução do homem moderno, nós devemos começar jogando fora o gene como a única base das nossas idéias sobre a evolução". Os que notaram talvez a tenham creditado a um erro de edição. Ou, na obsessão por afastar o cálice da biologia dos lábios sacrossantos do comportamento humano, resolveram simplesmente varrê-la para baixo do tapete e seguir atirando no mensageiro.
Dawkins tem pago o preço de sua honestidade intelectual desde então. "O Gene Egoísta" foi publicado apenas um ano depois de o também zoólogo Edward Osborne Wilson, de Harvard, ter despertado a fúria da "ciência marxista" (acredite, isso já existiu) com a publicação de "Sociobiologia", a primeira obra a dizer com todas as letras (e sem muito tato) que o comportamento humano poderia ser explicado pela seleção natural darwinista.Embora hoje isso seja óbvio em certa medida -dado que o comportamento é produto do cérebro e o cérebro é objeto de seleção natural-, Wilson foi chamado de porco nazista.
Ao dar munição à sociobiologia com suas idéias sobre genética, Dawkins também virou alvo. O máximo expoente da "biologia dialética", Richard Lewontin, chegou a deturpar uma passagem de "O Gene Egoísta". Onde Dawkins dizia "eles [os genes] nos criaram, corpo e mente", Lewontin enxertou "eles nos controlam, corpo e mente". Até hoje não se desculpou por isso.
Com "Deus, um Delírio", o zoólogo britânico volta a atrair detratores, de ambas as extremidades do espectro político, de todas as cores e -principalmente- credos. Seu único crime terá sido meter a mão num vespeiro (a religião) para o qual os cientistas têm insistido em dar as costas, enquanto dele esvoaçam sem cessar fanáticos do calibre de Osama Bin Laden e George W. Bush. Dawkins esnoba os críticos. Ele sabe que o "meme" darwinista triunfa, e que a luz já foi lançada sobre o mistério da existência humana.
Tive o desprazer de conversar com Richard Dawkins apenas duas vezes na vida. É um sujeito antipático, pedante e de uma intolerância insuportável. Exatamente o oposto da personalidade que se espera encontrar em alguém cuja profissão de (ops!) fé é levar a ciência ao grande público. E que é, goste-se ou não dele, um dos intelectuais mais brilhantes que a seleção natural já produziu.
Talvez essa certeza de superioridade, que transborda nos escritos do biólogo britânico, explique em parte por que Dawkins é tão vilipendiado pelos ditos intelectuais "de esquerda" e "culturalistas", para não falar nos (credo!) pós-modernos. Essa patota não hesita em pichá-lo de darwinista bitolado que não consegue enxergar nada além de genes egoístas tramando a destruição do livre-arbítrio humano.
São poucos, no entanto, os que terão notado a seguinte passagem no clássico dos clássicos de Dawkins, "O Gene Egoísta", de 1976: "Para compreender a evolução do homem moderno, nós devemos começar jogando fora o gene como a única base das nossas idéias sobre a evolução". Os que notaram talvez a tenham creditado a um erro de edição. Ou, na obsessão por afastar o cálice da biologia dos lábios sacrossantos do comportamento humano, resolveram simplesmente varrê-la para baixo do tapete e seguir atirando no mensageiro.
Dawkins tem pago o preço de sua honestidade intelectual desde então. "O Gene Egoísta" foi publicado apenas um ano depois de o também zoólogo Edward Osborne Wilson, de Harvard, ter despertado a fúria da "ciência marxista" (acredite, isso já existiu) com a publicação de "Sociobiologia", a primeira obra a dizer com todas as letras (e sem muito tato) que o comportamento humano poderia ser explicado pela seleção natural darwinista.Embora hoje isso seja óbvio em certa medida -dado que o comportamento é produto do cérebro e o cérebro é objeto de seleção natural-, Wilson foi chamado de porco nazista.
Ao dar munição à sociobiologia com suas idéias sobre genética, Dawkins também virou alvo. O máximo expoente da "biologia dialética", Richard Lewontin, chegou a deturpar uma passagem de "O Gene Egoísta". Onde Dawkins dizia "eles [os genes] nos criaram, corpo e mente", Lewontin enxertou "eles nos controlam, corpo e mente". Até hoje não se desculpou por isso.
Com "Deus, um Delírio", o zoólogo britânico volta a atrair detratores, de ambas as extremidades do espectro político, de todas as cores e -principalmente- credos. Seu único crime terá sido meter a mão num vespeiro (a religião) para o qual os cientistas têm insistido em dar as costas, enquanto dele esvoaçam sem cessar fanáticos do calibre de Osama Bin Laden e George W. Bush. Dawkins esnoba os críticos. Ele sabe que o "meme" darwinista triunfa, e que a luz já foi lançada sobre o mistério da existência humana.
sexta-feira, setembro 21, 2007
Nome aos bois
Estes são os picaretas de SC que votaram a favor da CPMF e CONTRA O POVO:
Angela Amin (PP), Carlito Merss (PT), Celso Maldaner (PMDB), Cláudio Vignatti (PT), Décio Lima (PT), Djalma Berger (PSB), Edinho Bez (PMDB), João Matos (PMDB), João Pizzolatti (PP), Nelson Goetten (PR), Odacir Zonta (PP) e Valdir Colatto (PMDB).
A favor do povo, que paga os impostos, ficaram apenas quatro deputados: Fernando Coruja (PPS), Gervásio Silva (Dem), Paulo Bornhausen (DEM) e José Carlos Vieira (DEM).
Engraçada esta nossa "política". Aqui em SC, PP e PMDB se engalfinham; ainda são os grandes adversários históricos. Lá em Brasília, no entanto, votam juntinhos e fazem tudo o que o mestre mandar. O que os une e separa? Cargos. Aqui, não estão juntos simplesmente porque não há como acomodar a todos no mesmo governo. O governador Luiz Henrique da Silveira (PMDB) teve que inventar secretarias regionais para empregar todos os puxa-sacos. Já no governo federal cabe todo mundo. Por isso, Angela Amin vota juntinho com todos os peemedebistas. E dane-se o povo, que segue pagando o pato: a maior carga tributária de um país subdesenvolvido.
Angela Amin (PP), Carlito Merss (PT), Celso Maldaner (PMDB), Cláudio Vignatti (PT), Décio Lima (PT), Djalma Berger (PSB), Edinho Bez (PMDB), João Matos (PMDB), João Pizzolatti (PP), Nelson Goetten (PR), Odacir Zonta (PP) e Valdir Colatto (PMDB).
A favor do povo, que paga os impostos, ficaram apenas quatro deputados: Fernando Coruja (PPS), Gervásio Silva (Dem), Paulo Bornhausen (DEM) e José Carlos Vieira (DEM).
Engraçada esta nossa "política". Aqui em SC, PP e PMDB se engalfinham; ainda são os grandes adversários históricos. Lá em Brasília, no entanto, votam juntinhos e fazem tudo o que o mestre mandar. O que os une e separa? Cargos. Aqui, não estão juntos simplesmente porque não há como acomodar a todos no mesmo governo. O governador Luiz Henrique da Silveira (PMDB) teve que inventar secretarias regionais para empregar todos os puxa-sacos. Já no governo federal cabe todo mundo. Por isso, Angela Amin vota juntinho com todos os peemedebistas. E dane-se o povo, que segue pagando o pato: a maior carga tributária de um país subdesenvolvido.
Faroeste caboclo
"Ele queria era falar pro presidente
pra ajudar toda esta gente
que só faz sofrer" (Legião Urbana)
Notem que o pobre coitado não quer um esmolão; quer educação para os filhos, atendimento médico de qualidade e policiamento!
Lavrador invade Planalto para pedir ajuda
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Enquanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva concedia uma entrevista ao jornal "The New York Times", no terceiro andar do Palácio do Planalto, um incidente mobilizou a segurança no saguão. Ângelo de Jesus, 37, agricultor baiano, invadiu o local por volta das 9h. Ele queria falar com Lula. Passou direto pelo detector de metais, mas foi rendido pelos seguranças do Planalto -foram necessários seis para segurá-lo. "Presidente, salva eu, salva eu presidente", gritava o agricultor.
Ângelo insistia em falar com Lula e se debatia, tentando se desvencilhar dos seguranças. Disse aos jornalistas que estava há quatro dias sem comer e que sofria de hanseníase. Saiu do palácio algemado e carregado por seguranças e policiais militares, chamados ao local. De ambulância, foi levado ao Hospital Regional da Asa Norte, aonde chegou, segundo funcionários, "com desorientação" e freqüência cardíaca de 144 batimentos por minuto.
Segundo a assistente social Edna Joaquim de Moraes, ele disse que havia vindo para Brasília, de carona, "por causa das injustiças em sua cidade", mas já havia desistido de falar com Lula porque "o povo não tem vez". Edna ligou para um departamento de assistência social do Distrito Federal para providenciar uma passagem de volta para o agricultor, mas, ao pedir um carro do hospital para levá-lo ao departamento, viu que ele havia sumido.
Segundo a Presidência, Ângelo foi transferido para o Hospital das Forças Armadas, onde um médico e um assessor do gabinete pessoal de Lula acompanham o agricultor. Funcionários também tentavam, até ontem à tarde, contatar familiares de Ângelo. Ele é natural de Pindobaçu, Bahia.
Do orelhão da cidade, a mulher de Ângelo e uma de suas vizinhas, que viram tudo pela TV, disseram que, na segunda-feira, ele encontrou uma amiga da família no ponto de ônibus e pediu que ela avisasse que ele ia a Brasília falar com Lula. Segundo a vizinha, "ele está muito revoltado" com a escola de seus quatro filhos, que tem um esgoto aberto, com a falta de policiamento e com o sistema de saúde do município.
Tentativas de invasões e protestos são relativamente comuns nas áreas do governo. Em 2004, um ex-prefeito de Diadema se acorrentou no hall de entrada do Planalto. Em 2005, um mecânico desempregado subiu a rampa do Planalto de mobilete. Em 2003, um vendedor ambulante tentou invadir o Palácio da Alvorada, e derrubou o portão com um Fiat Uno.
pra ajudar toda esta gente
que só faz sofrer" (Legião Urbana)
Notem que o pobre coitado não quer um esmolão; quer educação para os filhos, atendimento médico de qualidade e policiamento!
Lavrador invade Planalto para pedir ajuda
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Enquanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva concedia uma entrevista ao jornal "The New York Times", no terceiro andar do Palácio do Planalto, um incidente mobilizou a segurança no saguão. Ângelo de Jesus, 37, agricultor baiano, invadiu o local por volta das 9h. Ele queria falar com Lula. Passou direto pelo detector de metais, mas foi rendido pelos seguranças do Planalto -foram necessários seis para segurá-lo. "Presidente, salva eu, salva eu presidente", gritava o agricultor.
Ângelo insistia em falar com Lula e se debatia, tentando se desvencilhar dos seguranças. Disse aos jornalistas que estava há quatro dias sem comer e que sofria de hanseníase. Saiu do palácio algemado e carregado por seguranças e policiais militares, chamados ao local. De ambulância, foi levado ao Hospital Regional da Asa Norte, aonde chegou, segundo funcionários, "com desorientação" e freqüência cardíaca de 144 batimentos por minuto.
Segundo a assistente social Edna Joaquim de Moraes, ele disse que havia vindo para Brasília, de carona, "por causa das injustiças em sua cidade", mas já havia desistido de falar com Lula porque "o povo não tem vez". Edna ligou para um departamento de assistência social do Distrito Federal para providenciar uma passagem de volta para o agricultor, mas, ao pedir um carro do hospital para levá-lo ao departamento, viu que ele havia sumido.
Segundo a Presidência, Ângelo foi transferido para o Hospital das Forças Armadas, onde um médico e um assessor do gabinete pessoal de Lula acompanham o agricultor. Funcionários também tentavam, até ontem à tarde, contatar familiares de Ângelo. Ele é natural de Pindobaçu, Bahia.
Do orelhão da cidade, a mulher de Ângelo e uma de suas vizinhas, que viram tudo pela TV, disseram que, na segunda-feira, ele encontrou uma amiga da família no ponto de ônibus e pediu que ela avisasse que ele ia a Brasília falar com Lula. Segundo a vizinha, "ele está muito revoltado" com a escola de seus quatro filhos, que tem um esgoto aberto, com a falta de policiamento e com o sistema de saúde do município.
Tentativas de invasões e protestos são relativamente comuns nas áreas do governo. Em 2004, um ex-prefeito de Diadema se acorrentou no hall de entrada do Planalto. Em 2005, um mecânico desempregado subiu a rampa do Planalto de mobilete. Em 2003, um vendedor ambulante tentou invadir o Palácio da Alvorada, e derrubou o portão com um Fiat Uno.
quarta-feira, setembro 19, 2007
Pesquisa em jornalismo
O curso de mestrado em jornalismo da UFSC está realizando o I Simpósio de Pesquisa Avançada da Região Sul, transmitido ao vivo pela internet.
sábado, setembro 15, 2007
Congresso em foco
Por que gosto muito de Perez e Simon. Na lista, também está o Fernando Coruja, o melhor congressista catarinense. É claro que o fato de estar na lista não significa atestado de competência e ética, pois lá está também a Ideli Salvasti Calheiros - defensora dos mensaleiros e de senador criador de bois voadores e de pomares de laranja.
quinta-feira, setembro 13, 2007
Booom!
O nosso 12 de setembro: um atentado contra o Senado Federal, um deboche à frágil democracia brasileira.
quinta-feira, setembro 06, 2007
Simulação do eclipse solar
O Grupo de Estudos de Astronomia da UFSC fez uma simulação do eclipse parcial do sol que vai ocorrer na próxima terça-feira de manhã.
segunda-feira, setembro 03, 2007
coragem, inteligência e honestidade
Da Folha de S. Paulo. Alguém corajoso no Itamaraty a ponto de contraditar os stalinistas de plantão.
Excelência, defina "elite".
Quando alguém me pergunta qual o principal problema do Brasil atual, não hesito em responder: a falta de precisão vocabular. Vivemos sob o império dos sofismas, em que toda ilegalidade tem direito a um eufemismo, todo impostor, livre acesso à honradez, e toda bravata, o status de argumento. Num ambiente semelhante, o debate público, sério e fundamentado, se torna inviável.
Exemplos existem aos montes, mas talvez nenhum deles seja tão grave quanto a utilização que se vem fazendo do termo "elite". Toda vez que um de nossos dirigentes precisa livrar-se de acusações, desqualificar opositores ou simplesmente neutralizar qualquer crítica, a palavra "elite" surge como o pecado feito verbo. Ela encarna tudo o que há de ruim e malvado, o dolo em essência, o egoísmo mais nocivo, a traição sempre à espreita.
Curiosamente, essa "elite" não tem rosto. Ela é sempre o outro -o inimigo, o desafeto, o adversário, o opositor. Em suma: o dissenso. Diz-se pertencer à "elite" o indivíduo ou instituição que ouse questionar os atos do poder. Em qualquer língua do planeta, esse substantivo afrancesado -"elite"- inclui o estamento dirigente da nação. Salvo no idioma falado pelos próceres de nossa República.
Aqui, ministros de Estado, secretários de governo, parlamentares, magistrados, diretores de bancos e empresas estatais, nenhum se julga parte da "elite". Tampouco são vistos como integrantes da "elite" usineiros heróicos, empreiteiros amigos, marqueteiros audazes ou banqueiros satisfeitos.
Já o cidadão de classe média que manifesta publicamente o seu desagrado com o Estado de anomia do país é, de imediato, acusado de tramar o eterno retorno das desigualdades sociais e da concentração de renda. A ofensa é absurda, mas poucos se dão conta disso. Ora, quem paga os elevadíssimos impostos que, já de algum tempo, são cobrados no Brasil não pode ser acusado de responsável pelo atraso da nação. Os verdadeiros culpados são aqueles que tomam esses impostos sem investir corretamente na educação do povo e no desenvolvimento de nossas forças produtivas.
As "bandas podres" existem, disso não resta a menor dúvida. Mas hoje, tal como ontem, elas vivem em conúbio com o Estado. O atual governo não moveu uma palha para mudar tal quadro. Pelo contrário, especializou-se em lotear cargos e apadrinhar o fisiologismo. Além disso, encampou a ortodoxia monetária tucana, continuando a desperdiçar o arrocho fiscal no enriquecimento dos grandes investidores nacionais e estrangeiros.
Como pode então que os dirigentes continuem a ver nas vaias de alguns ou nas críticas da imprensa a mão conspiratória da "elite"? Dá vontade de dizer: "Excelência, defina elite!". O uso sofístico do conceito de "elite" teve sua origem em nossa intelectualidade. Foi ela quem ensinou aos atuais homens de poder a conveniente manipulação da antinomia elite-povo e quem primeiro se auto-excluiu da tão odiosa "elite brasileira".
Ao passar décadas tratando a "elite" como um bloco monolítico e, sobretudo, ao fazer de conta que um país justo se possa estruturar sem elites técnicas, científicas, intelectuais, políticas, burocráticas, artísticas e econômicas, nossa intelectualidade transformou o conceito em um mero clichê ao dispor das lideranças populistas de viés autoritário. Basta-lhes agora dizer "eu sou o povo" e todo questionamento passa a estar identificado com a insatisfação da "elite reacionária".
Basta-lhes repetir "o povo chegou ao poder" e o papel histórico da democracia se cumpre, tornando-se ela um instrumento obsoleto. Para que alternância de partidos se quem está de fora é a "elite"? O atual debate sobre a crise aérea espelha à perfeição os efeitos nefastos desse pântano conceitual. Todas as críticas são ditas "provenientes da elite". O próprio tema dos aeroportos em pane e do caos regulatório do setor é tratado como um assunto menor, de exclusivo interesse da "elite".
Dois aviões já caíram. Quantos mortos a mais serão necessários para que os governistas de plantão acordem de seu transe? Nenhum povo jamais foi redimido pelo sucateamento dos setores de ponta da economia. Em um debate público sério, estaríamos agora discutindo a crônica incapacidade de nossos governos em assegurar a modernização da infra-estrutura do país. Ao insistirmos na utilização oportunista de conceitos, continuaremos enfrentando crise após crise. O Brasil ficará para trás. A pobreza se eternizará. E a democracia descerá pelo ralo.
MARCELO OTÁVIO DANTAS , 43, formado em ciências econômicas pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), é escritor, roteirista e diplomata de carreira, autor do livro "Três Vezes Mago" (no prelo). É chefe da Divisão de Assuntos Multilaterais Culturais do Ministério das Relações Exteriores.
Excelência, defina "elite".
Quando alguém me pergunta qual o principal problema do Brasil atual, não hesito em responder: a falta de precisão vocabular. Vivemos sob o império dos sofismas, em que toda ilegalidade tem direito a um eufemismo, todo impostor, livre acesso à honradez, e toda bravata, o status de argumento. Num ambiente semelhante, o debate público, sério e fundamentado, se torna inviável.
Exemplos existem aos montes, mas talvez nenhum deles seja tão grave quanto a utilização que se vem fazendo do termo "elite". Toda vez que um de nossos dirigentes precisa livrar-se de acusações, desqualificar opositores ou simplesmente neutralizar qualquer crítica, a palavra "elite" surge como o pecado feito verbo. Ela encarna tudo o que há de ruim e malvado, o dolo em essência, o egoísmo mais nocivo, a traição sempre à espreita.
Curiosamente, essa "elite" não tem rosto. Ela é sempre o outro -o inimigo, o desafeto, o adversário, o opositor. Em suma: o dissenso. Diz-se pertencer à "elite" o indivíduo ou instituição que ouse questionar os atos do poder. Em qualquer língua do planeta, esse substantivo afrancesado -"elite"- inclui o estamento dirigente da nação. Salvo no idioma falado pelos próceres de nossa República.
Aqui, ministros de Estado, secretários de governo, parlamentares, magistrados, diretores de bancos e empresas estatais, nenhum se julga parte da "elite". Tampouco são vistos como integrantes da "elite" usineiros heróicos, empreiteiros amigos, marqueteiros audazes ou banqueiros satisfeitos.
Já o cidadão de classe média que manifesta publicamente o seu desagrado com o Estado de anomia do país é, de imediato, acusado de tramar o eterno retorno das desigualdades sociais e da concentração de renda. A ofensa é absurda, mas poucos se dão conta disso. Ora, quem paga os elevadíssimos impostos que, já de algum tempo, são cobrados no Brasil não pode ser acusado de responsável pelo atraso da nação. Os verdadeiros culpados são aqueles que tomam esses impostos sem investir corretamente na educação do povo e no desenvolvimento de nossas forças produtivas.
As "bandas podres" existem, disso não resta a menor dúvida. Mas hoje, tal como ontem, elas vivem em conúbio com o Estado. O atual governo não moveu uma palha para mudar tal quadro. Pelo contrário, especializou-se em lotear cargos e apadrinhar o fisiologismo. Além disso, encampou a ortodoxia monetária tucana, continuando a desperdiçar o arrocho fiscal no enriquecimento dos grandes investidores nacionais e estrangeiros.
Como pode então que os dirigentes continuem a ver nas vaias de alguns ou nas críticas da imprensa a mão conspiratória da "elite"? Dá vontade de dizer: "Excelência, defina elite!". O uso sofístico do conceito de "elite" teve sua origem em nossa intelectualidade. Foi ela quem ensinou aos atuais homens de poder a conveniente manipulação da antinomia elite-povo e quem primeiro se auto-excluiu da tão odiosa "elite brasileira".
Ao passar décadas tratando a "elite" como um bloco monolítico e, sobretudo, ao fazer de conta que um país justo se possa estruturar sem elites técnicas, científicas, intelectuais, políticas, burocráticas, artísticas e econômicas, nossa intelectualidade transformou o conceito em um mero clichê ao dispor das lideranças populistas de viés autoritário. Basta-lhes agora dizer "eu sou o povo" e todo questionamento passa a estar identificado com a insatisfação da "elite reacionária".
Basta-lhes repetir "o povo chegou ao poder" e o papel histórico da democracia se cumpre, tornando-se ela um instrumento obsoleto. Para que alternância de partidos se quem está de fora é a "elite"? O atual debate sobre a crise aérea espelha à perfeição os efeitos nefastos desse pântano conceitual. Todas as críticas são ditas "provenientes da elite". O próprio tema dos aeroportos em pane e do caos regulatório do setor é tratado como um assunto menor, de exclusivo interesse da "elite".
Dois aviões já caíram. Quantos mortos a mais serão necessários para que os governistas de plantão acordem de seu transe? Nenhum povo jamais foi redimido pelo sucateamento dos setores de ponta da economia. Em um debate público sério, estaríamos agora discutindo a crônica incapacidade de nossos governos em assegurar a modernização da infra-estrutura do país. Ao insistirmos na utilização oportunista de conceitos, continuaremos enfrentando crise após crise. O Brasil ficará para trás. A pobreza se eternizará. E a democracia descerá pelo ralo.
MARCELO OTÁVIO DANTAS , 43, formado em ciências econômicas pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), é escritor, roteirista e diplomata de carreira, autor do livro "Três Vezes Mago" (no prelo). É chefe da Divisão de Assuntos Multilaterais Culturais do Ministério das Relações Exteriores.
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