O BNDES é uma mãezona, mesmo. Esta entrevista da Folha de S. Paulo de hoje vale a pena.
Diretor do Banco Central (1980-1982) numa época em que o Brasil estava a léguas de distância do grau de investimento conquistado na semana passada, o economista Claudio Haddad, 61, acompanhou- sempre de uma posição privilegiada- a evolução do mercado de capitais do país. Foi sócio do banco Garantia e hoje é diretor-presidente do Ibmec (Instituto Brasileiro do Mercado de Capitais), em São Paulo. Haddad diz que o grau de investimento é motivo de comemoração, mas que o Brasil ainda oferece muitos outros motivos para preocupação. Entre eles, o que chama de "dinheiro fácil" com que o BNDES financia grandes grupos empresariais. Leia trechos da entrevista.
FOLHA - O senhor criticou enfaticamente o crédito que o BNDES concedeu à Vale. Como vê o apoio para a reestruturação societária da Oi?
CLÁUDIO HADDAD - São companhias muito grandes, que têm todas as condições de se capitalizar no mercado. O valor patrimonial da Vale é de quase R$ 300 bilhões. É uma empresa próspera, que gera caixa, bate recordes de exportação. Teria todas as condições de ir ao mercado e obter excelentes condições de financiamento.
FOLHA - Segundo a Vale, são recursos para investimentos.
HADDAD - Na verdade, é irrisória [a linha de crédito] para a Vale. Mas é muito dinheiro para o BNDES. Complica ainda mais se pensarmos que boa parte dos recursos do banco vem do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador). São recursos que o trabalhador brasileiro está subsidiando. Aliás, se a Vale, com o tamanho que tem, precisa de subsídios do BNDES para tocar projetos, talvez sejam projetos que não precisem ser tocados.
FOLHA - E quanto à reestruturação societária da Oi?
HADDAD - O mercado está muito fácil, há liquidez para empresas brasileiras. Existe um amplo mercado de financiamento que os controladores da Oi poderiam buscar. É possível dar as garantias necessárias, tudo o que se exigiria para a operação.
FOLHA - Com o grau de investimento, as condições de obter crédito lá fora melhoram?
HADDAD - Mas as condições já estavam boas! Agora, ficarão melhores. Antes, havia inflação no Brasil, não havia mercado financeiro sólido, não havia financiamento de longo prazo. Mas hoje há várias alternativas no mercado interno e externo.
FOLHA - Há prejuízo para o mercado de capitais?
HADDAD - Sim. Uma das razões para que o mercado financeiro, historicamente, tenha se desenvolvido pouco no país foi a alternativa fácil de poupança oferecida pelos bancos oficiais. Ou seja, o dinheiro fácil do BNDES. O BNDES precisa incentivar o desenvolvimento, e não emprestar dinheiro barato a companhias que podem se financiar no mercado. É preciso romper com isso.
FOLHA - Por que não se rompe?
HADDAD - É um pouco a essência do que alguns chamam de política industrial. No fundo, é a escolha de setores e empresas favorecidas, as campeãs. Foi assim com a proteção ao setor de informática, nos anos 70, com o projeto nuclear. E o que resultou? Destruição de recursos. Se é um projeto socialmente relevante, ambientalmente relevante, que tem rentabilidade baixa, faz parte do papel do BNDES. Não é o caso da Vale ou da Oi.
FOLHA - No caso da Oi, o argumento é que o apoio à reestruturação será fundamental para a consolidação do setor, com a compra da Brasil Telecom.
HADDAD - O BNDES, que é um braço do governo, garante uma reestruturação societária que resultará numa operação de aquisição que ainda depende de uma mudança na lei!
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